Nesta crónica, gostava de partilhar consigo, Caro(a) Leitor(a), um tema que me preocupa há já alguns anos, que tem a ver com a erosão na orla marítima de Gaia.
Gostava, desde já, de chamar a sua atenção, para um estudo elaborado pela Dr.ª Luísa Pinheiro, investigadora da Universidade de Aveiro, no qual “identifica a existência de cerca de 4.000 casas ameaçadas pelo mar, só na zona entre as praias da Vila da Madalena e de Esmoriz”.
Neste estudo, afirma convictamente a investigadora, que “a ameaça às defesas do litoral e o recuo da linha costeira na Granja – Arcozelo; em S. F. Marinha, ou em Esmoriz estão a ser provocados pelo défice de sedimentos, que ficam retidos a montante, em consequência da construção de infra-estruturas portuárias (Leixões); fluviais (barragens do Douro); da construção do exutor submarino, em Canidelo; além de se ter permitido construir nas dunas das praias, (veja-se o caso da Madalena…)”.
O défice de sedimentos, anteriormente referido, tem a ver com o facto do Rio Douro, em situação normal, alimentaria a costa marítima com 1,2 milhões de metros cúbicos de sedimentos por ano (m3/ano), aos quais se juntariam 200 mil transportados pela deriva litoral entre Leixões e a foz do Douro. Com as barragens, este valor reduziu a sua capacidade aluvionar para apenas 200 mil m3/ano.
Existem ainda, outros estudos, que indicam uma redução dos volumes sedimentares transportados por via fluvial em mais de 85% ao longo do século XX, devido aos aproveitamentos hidroeléctricos e hidroagrícolas. Quando as comportas de fundo das barragens são abertas devido a cheias, o volume de areias na foz aumenta significativamente, o que evidencia o efeito de retenção.
Posto isto, gostaria de convidar-vos a efectuarmos um passeio calmo, a pé pela orla marítima de Gaia.
Ao longo dos 17 quilómetros da orla marítima de Gaia, e em particular, desde Lavadores até à Vila da Madalena, pode observar-se o “granito azul”, em afloramentos de grandes blocos arrendados que salpicam as plataformas de erosão marinhas próximas do nível do mar e que desta forma impedem o seu avanço.
Na zona de Canidelo Sul, é possível observarmos um esporão, (um aglomerado de blocos rochosos colocados perpendicularmente à linha da costa pelo Homem), onde se verifica a sedimentação excessiva do lado Norte e a erosão do lado Sul. Daqui, resulta que a Praia de Canide – Sul, “ganhou” areal, ou seja, verificou-se uma regressão do mar, pelo contrário, a Praia da Madalena – Norte, está a “perder” areal, ou seja é evidente uma progressão do mar sobre a terra.
Entrando na orla marítima da Vila da Madalena, verifica-se que os 2.100 metros de frente de mar, estão continuamente a desaparecer, a serem engolidos pelo mar, em especial, (como já referi) na Praia Madalena – Norte, aqui nota-se uma evidente redução ano após ano, do areal ali existente.
O mar na Vila da Madalena, desde finais da década de 90, do século XX, avançou, cerca de 10 metros sob a duna primária, em Fevereiro último, na preia-mar, e com um desnível de cerca de um metro mais alto do mar em relação aos terrenos urbanizados daquela zona: o que quer dizer que se as águas salgadas entrarem por todos aqueles terrenos, casas e moradias, serão rapidamente inundados, (teremos, mais uma vez, inundações no Ribeiro da Madalena, junto à Estação Elevatória, a ser um bom espaço para andar de barco…).
Ainda nesta Vila, verifica-se a existência de um cordão dunar, com particular interesse, em termos de flora, que em tempos, (1997), um Sr. Vereador do Ambiente do Município, pretendeu preservar, infelizmente, desde essa época até agora, nada foi efectuado continuando esse espaço desprotegido, ao abandono, servindo agora, para depósito de restos de obras…
Mas, continuando o nosso passeio, verifica-se que na Vila de Valadares, na Avª Infante Sagres, junto à Praia Valadares – Norte, em frente à Estação Elevatória, o mar tem progredido de uma forma assustadora, tendo já este ano, por diversas vezes, tocado esta rua.
Na Freguesia de Gulpilhares, verifica-se que nalgumas zonas o mar progrediu, caso junto ao “Palhota”, noutras o mar regrediu, veja o caso da zona junto ao “Areal”.
Continuando o nosso passeio, eis que chegamos a Arcozelo. Aqui constatamos que os pescadores, estão diariamente a colocar as suas vidas em risco quando saíem ou entram junto ao quebra-mar da Aguda, uma vez, que atendendo ao que falta construir do respectivo quebra – mar, aumentaram as condições de insegurança do mesmo, além deste ter provocado o aumento da concentração de sedimentos e areias a Norte e a Sul, bem como uma acumulação excessiva de areias. Junto ao “Tendências Bar”, é possível constatar o que o mar progrediu nos últimos anos, apesar desta zona ser bastante rochosa, (funcionando, por isso de protecção ao cordão dunar).
Para finalizar esta caminhada, chegamos à S.F. Marinha, com particular destaque para a zona da Assembleia da Granja e da Praia Boca Mar, dois locais onde, fruto da diminuição de acumulação de sedimentos origina uma rápida erosão marinha da costa, pelo que foram aí depositadas toneladas de areias, (vindas de Arcozelo), para evitar uma maior progressão do mar nestas zonas e para salvaguarda das populações aí residentes.
Ainda nesta freguesia, junto à Piscina da Granja, na zona balnear da Granja, podemos aferir que onde “ontem”, as pessoas podiam fazer praia, “hoje”, não têm um metro de areia.
Há quantos anos autarcas, população e em particular, pescadores e moradores da orla costeira de Gaia, têm vindo a alertar, a protestar, a reclamar atenção de quem de direito, para que não se deixe, (ou deixasse), destruir esta riqueza nacional?
Diz-nos, a voz sábia dos pescadores que os “enchimentos artificiais” de areia efectuados este ano em S. F. Marinha, “ é como pôr açúcar no café…” o mar desta maneira vai levá-los novamente.
Espero não vos ter cansado, neste passeio, no qual constatamos o estado da erosão da orla marítima de Gaia.
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